É cada vez mais comum vermos pessoas imersas em seus celulares, navegando por horas a fio nas redes sociais, publicando alguma coisa, enviando mensagens ou consumindo conteúdo online. A internet e os aparelhos móveis modificaram muito como interagimos, nos comunicamos ou consumimos informação. Entretanto, o tempo gasto nesses aparelhos tem crescido exponencialmente, como demonstram estudos na área, indicando um aumento no vício nas redes.
Esse aumento expressivo não surpreende se consideramos a ampla quantidade de aplicativos disponíveis, seja de redes sociais, jogos ou relacionados a qualquer função típica do nosso dia a dia. Por questões de praticidade e atratividade, estamos cada vez mais conectados e até dependentes desses aparelhos. A quantidade de conteúdos disponíveis também dificultam resistir ao impulso de pegar o celular para praticamente qualquer coisa — especialmente quando queremos preencher algum tempo livre.
Um vídeo engraçado que um amigo enviou, uma nova publicação de uma pessoa que você gosta, uma promoção de algo que você não precisa, somos constantemente bombardeados com notificações e conteúdos. As redes sociais se transformaram em um espaço onde nos conectamos e onde nos informamos. Seja com amigos, familiares ou até mesmo com pessoas desconhecidas, estamos sempre compartilhando momentos, opiniões e emoções.
No entanto, o problema surge quando esse uso se torna automático e desmedido. Estamos realmente aproveitando nosso tempo livre, ou estamos simplesmente consumindo conteúdo no “piloto automático”? Uma rápida tarefa no celular, como verificar uma mensagem, um e-mail ou pesquisar algo, acaba se transformando em uma verificação incessante das redes sociais. O tempo passa e, sem percebermos, estamos imersos no feed infinito das redes, vivendo um ciclo interminável de rolagem e consumo de informações.
O Como explica o médico Rodrigo Menezes Machado em entrevista à Folha de S. Paulo, a caracterização do uso de redes sociais como vício está justamente na perda de controle sobre a ação, quando ela ultrapassa os limites saudáveis, afetando o equilíbrio entre a vida online e a vida real.
O uso excessivo do celular e das redes sociais pode ser prejudicial para a produtividade, seja no trabalho ou no estudo, comprometer as relações pessoais e interferir também no bem-estar emocional e mental. A necessidade de estar constantemente conectado tem como consequência o desenvolvimento da pressão social para estar sempre disponível, gerando mais estresse e ansiedade.
Um dos riscos mais significativos associados ao vício em redes sociais são os problemas relacionados à autoestima e à autoimagem. Os conteúdos de mais engajamento nas redes sociais em geral são imagens perfeitas, idealizadas e irreais que causam comparações infundadas e sentimentos de inadequação. Muitas pessoas desenvolvem uma obsessão por parecerem perfeitas, assim como, nas fotos que veem nas redes sociais, as quais são tratadas com filtros e aplicativos de mudança de aparência estética, levando a problemas de distorção da realidade e da própria imagem.
Essa questão é particularmente séria para pessoas mais jovens, ainda em processo de identificação e construção da própria personalidade. Segundo um estudo publicado no início do ano pelo jornal The Guardian, três em cada quatro crianças de até 12 anos não gostam de seus corpos e se dizem constrangidas em relação à própria aparência. Os números aumentam de 08 em cada 10 jovens para a faixa entre os 18 e 21 anos. A pesquisa foi realizada pela stem4, uma instituição de caridade que apoia a saúde mental positiva em adolescentes.
Além dos problemas de saúde mental, o uso excessivo das redes sociais também afeta negativamente a qualidade do sono. Muitas pessoas se encontram rolando seus feeds até altas horas da noite, comprometendo o descanso adequado. A exposição constante à luz azul dos dispositivos eletrônicos interrompe o ritmo natural do sono, além de aumentar os níveis de dopamina, aumentando os problemas relacionados à questão.
Embora a responsabilidade recaia constantemente sobre os usuários, não podemos esquecer da participação das empresas de tecnologias em seu papel na redução da dependência das redes sociais. São muitas as estratégias empregadas pelas grandes empresas de tecnologia para manter os usuários presos às plataformas. Elas investem em técnicas de design e psicologia comportamental para capturar e reter a atenção dos usuários, visando maximizar o tempo gasto nas redes sociais.
Como explica Tristan Harris, ex- designer de Ética do Google, em entrevista à CNN, existem pessoas cuja função é entender como prender a atenção de uma pessoa e fazer com que ela sempre volte. “A compulsividade é projetada. Há engenheiros cujo único trabalho é entender como tomar a maior parte da atenção de alguém e fazer com que ela volte no dia seguinte”.
As empresas se empenham para criar um ambiente altamente envolvente, onde cada detalhe é projetado para incentivar a interação sem fim. Recursos como notificações constantes, rolagem infinita, recomendações personalizadas e feedback instantâneo são cuidadosamente planejados e incorporados às redes sociais para estimular a compulsão e a dependência.
O objetivo não é segredo para ninguém: as empresas querem aumentar a participação do usuário para, consequentemente, gerar mais receita por meio da publicidade direcionada. Quanto mais tempo os usuários passarem nas redes sociais, mais anúncios serão exibidos e mais dados serão coletados, mais empresas vão querer anunciar na plataforma, alimentando os lucros.
Diante desse cenário, surge a necessidade de regulamentações cada vez mais sofisticadas e medidas que responsabilizem as empresas de tecnologia por suas práticas. É preciso estabelecer diretrizes éticas e limites para o design das plataformas, garantindo que a atenção do usuário seja valorizada e não explorada.
As empresas de tecnologia precisam ter a responsabilidade de criar um ambiente digital mais saudável, priorizando a ética e o bem-estar dos usuários. Isso envolve reavaliar suas práticas de design, promover o uso consciente da tecnologia e oferecer recursos que incentivem o equilíbrio e o tempo de qualidade offline.
Por outro lado, é fundamental também que os usuários estejam conscientes dos impactos negativos do uso excessivo de redes sociais e busquem estabelecer limites saudáveis em seu próprio comportamento online. A educação digital e a conscientização sobre os riscos do vício em redes sociais são essenciais para promover um uso mais equilibrado e consciente da tecnologia.